domingo, 1 de abril de 2018

No Domingo de Páscoa Há Música




"Era a época da Páscoa que se enchia de muitos momentos de grande assombro. Momentos que nunca me abandonaram e que me trazem odor , cor e ternura.
Era o tempo da Primavera e, com ela, acordava o jardim numa festa de cor e de fragância. Com sabedoria, E.M. Cioran já afirmara: Se cheirássemos uma rosa até sentir a sua música, que outra marcha fúnebre nos abriria com maior delicadeza uma tumba no céu? E não perde o céu o seu próprio brilho, dissolvido numa melodia que baixa até nós? O jardim era isso: o reino encantado da minha mãe. Perdia-se nele todos os dias. Plantava, semeava, podava e acariciava cada jovem flor que brotava. (...) Entre elas, encantavam-me as tulipas. Eram singulares, majestosas e belas. Havia de todas as cores . Nesse tempo, eram, para mim, o prenúncio da Páscoa. Não havia festa pascal na Quinta sem o adorno dessas flores. Exerciam, sobre os meus olhos, um fascínio que me levava a contemplá-las , cada manhã da sua curta existência. Media-lhes o tamanho, a cor e a altivez erecta com que se apresentavam. Amarelas, vermelhas, lilases, pretas, brancas, azuis resplandeciam em exuberante sequência cromática. Essa profusa e intensa paleta capturava-me. Todo esse esplendor se perdeu, quando cresci e me fiz adulta. As tulipas das floristas não tinham qualquer resquício da beleza fulgurante desse jardim de infância: o reino encantado da minha mãe.
Nem os campos da florida Holanda, com uma inédita profusão de tulipas, foi capaz de rivalizar ou substituir esse encanto . A memória teima em corroborar que só na infância me foi possível esse deslumbramento. Experiência única que permanece inalterável num dos seus recônditos cantos."
Maria José Vieira de Sousa, in O livro que já escrevi

E porque é Páscoa, talvez a Música possa também provocar, em nós, o encanto e o deslumbramento ímpares dos dias a memorar.
A notável voz de Barbara Hendricks numa magnífica interpretação de Laudate Dominum  de Vesperae Solennes de Confessore, KV 339, de Wolfgang Amadeus Mozart a Capella Istropolitana interpretando  'Hallelujah" de "Messiah",  de Georg Friedrich Händel.

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