sábado, 23 de setembro de 2017

Entrevista

Entrevista


Telefonam-me do jornal: 
-Fale de amor - 
diz o repórter, 
como se falasse 
do assunto mais banal. 
-Do amor? -Me rio 
informal. Mas 
ele insiste: 
-Fale-me de amor - 
sem saber, displicente, 
que essa palavra 
é vendaval. 

-Falar de amor? - Pondero: 
o que está querendo, afinal? 
Quer me expor 
no circo da paixão 
como treinado animal? 

-Fala...-insiste o outro 
-Qualquer coisa. 
Como se o amor fosse 
“qualquer coisa” 
prá se embrulhar no jornal. 

-Fale bem, fale mal, 
uma coisa rapidinha 
-ele insiste, como se ignorasse 
que as feridas de amor 
não se lavam com água e sal. 

Ele perguntando 
eu resistindo, 
porque em matéria de amor 
e de entrevista 
qualquer palavra mal dita 
é fatal.
Affonso Romano de Sant'Anna 

"Nasceu em Juiz de Fora, M.G., em 1938. Poeta, ensaísta, professor e doutor em literatura pela UFMG. Teve actuação destacada no movimento literário dos anos 1950 e 1960, além de intensa vida académica no Brasil e no exterior. Publicou o primeiro livro Canto e palavra em 1965 e passou a escrever para os principais jornais do país, sem jamais abandonar a poesia. Publica, em 1975, Poesia sobre poesia ,1980, Que país é este? e em 1981, A morte da baleia (1991). Na prosa, destacam-se: Carlos Drummond de Andrade – análise da obra (1980), a sua tese de doutoramento, Análise estrutural do romance brasileiro (1973) e Por um novo conceito de literatura brasileira(1978). Por seis anos (1990-1996) dirigiu a Biblioteca Nacional, dotando-a de uma flexibilidade administrativa e modernizando muitos de seus serviços. Em 1998, foram reeditados e reunidos num só livro A grande fala do índio guarani e A catedral de Colónia. O interesse pela arte barroca rendeu dois livros: Barroco, a alma do Brasil (1997) e Barroco, do quadrado à elipse (2001). Tem cerca de 70 livros publicados, e em 2000 prestou uma contribuição significativa a quem quisesse  aventurar-se pelos caminhos da literatura, lançando A sedução da palavra, uma espécie de manual introdutório à criação literária. Em 2004 foi publicada a sua Poesia reunida 1965-1999, em dois volumes. Em 2007 publicou uma colectânea de ensaios ou cronicas culturais, como o autor prefere chamá-las: A cegueira e o saber. Obras mais recentes: Perdidos na Toscana (2009), Crónicas para jovens (2011), Ler o mundo ( 2011) e Como andar no labirinto (2012), uma colectânea reunindo 65 crónicas. "


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