quinta-feira, 6 de abril de 2017

Música para uma pausa

I'm on my hands and knees
searching every corner for my lost heart and soul
Hear me begging please
I'm searching every corner for my lost heart and soul

Now give me that Slow knowing smile
Like someone who may know their way
Give me that Slow knowing smile
That may make wanna say hey hey hey hey
Give me that Slow knowing smile
Give it to me
Slowly
Give me that Slow knowing smile
Give it to me
Slowly

A música é um começo que se perde sem fim. Quanto mais se ouve , mais se deseja ouvir. Um prazer feito de alegria, de esperança, de saudade, de sonho, de emoção , de volúpia , de amor e de muita liberdade interior. Cada um vive a música em si, em privado e sem restrições. Entra , desenvolve-se e aloja-se, alojando-nos num universo que é único, mesmo quando repartido. 
Como pretexto para uma diferente e variada audição, apresenta-se uma série de canções interpretada por vozes muito expressivas e talentosas. Uma colectânea para se ir ouvindo e sentindo neste Abril, enquanto Livres Pensantes faz uma pausa. 

Lisa Ekdahl, em Give Me That Slow Knowing Smile .(Imagens de Sam Toft.)
Madeleine Peyroux, em  "The Summer Wind" from "Half the Perfect World" 2006. (Imagens  de  Winslow Homer e Maurice Prendergast.
Etta James & B. B. King,  em  There's Something on Your Mind . (Imagens de  Amanda Cass)

Nina Simone, em  Angel Of The Morning. (Arte  de Dima Dmitriev).
Clara Bakker , em Temptation. ( Imagens de  Philip Gaida)
Norah Jones, em Will you still love me tomorrow. (Imagens de Mani Annie Art)

Vaya Con Dios, em Don't cry for Louie. (Imagens de David FeBland).

quarta-feira, 5 de abril de 2017

Exposições, Música, Cinema e Livros

Fundação Calouste Gulbenkian
EXPOSIÇÕES
Mudámos a hora!
Quintas e sábados, 10:00 — 21:00, segundas, quartas, sextas e domingo,10:00 — 18:00, Edifício Sede
A partir desta semana, a exposição José de Almada Negreiros: uma maneira de ser moderno passa a ter horário de abertura alargado, podendo ser visitada até às 21:00, todas as quintas e sábados, até 5 de Junho. A mostra dedicada a um dos artistas mais emblemáticos do modernismo português já foi vista por mais de 55 mil pessoas.
Waltraud Meier
MÚSICA
Waltraud Meier
Quinta, 06 Abril, 21:00, Grande Auditório

A meio-soprano alemã Waltraud Meier, uma das maiores intérpretes da actualidade, apresenta um reportório de Lieder de Gustav Mahler sobre poemas de Friedrich Rückert. Acompanha-a a Orquestra Gulbenkian dirigida pelo maestro Lorenzo Viotti.

Festa do Cinema Italiano 2017
por Tiago Resende
"O filme “Sonhos Cor-de-Rosa”, do realizador italiano Marco Bellocchio será o filme de abertura da 10ª edição da Festa do Cinema Italiano, com estreia em todas as salas de cinema nacionais na quinta-feira (dia 5 de abril). A Festa do Cinema Italiano realiza-se de 5 a 13 de abril e, pela primeira vez, acontece simultaneamente em cinco cidades: Lisboa, Porto, Coimbra, Almada e Setúbal, seguindo depois para mais de 15 cidades portuguesas e três países: Brasil, Angola e Moçambique.
“Turim, 1969. A infância idílica de Massimo, um menino de 9 anos, é pulverizada pela misteriosa morte da mãe. O rapaz recusa-se a aceitar a brutal perda, ainda que o padre lhe diga que a mãe está no Céu. Anos mais tarde, na década de 90, o Massimo adulto é um jornalista bem-sucedido. Depois de uma reportagem sobre a guerra em Sarajevo, começa a ter ataques de pânico. Quando começa a tratar da venda da casa dos pais, Massimo é obrigado a regressar ao seu passado traumático. Mas a compreensiva Dra. Elisa ajuda o Massimo a abrir-se e a confrontar as suas feridas de infância…”
Recebido com grande entusiasmo na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, “Sonhos Cor-de-Rosa” explora o luto e o medo de viver num drama elegante e contido interpretado por Valerio Mastandrea e Bérénice Béjo.
A edição deste ano conta com cerca de 50 filmes, com destaque para a cidade de Nápoles, protagonista da secção FOCUS, onde é mostrada a cultura de um dos lugares mais icónicos do mundo, seja através do cinema, com destaque ao mítico Totò, da literatura, com foco no fenómeno literário Elena Ferrante, da música ou da gastronomia.
Por ocasião do centenário do seu nascimento, a Festa do Cinema Italiano dedicará, em colaboração com a Cinemateca Portuguesa, uma homenagem ao realizador e argumentista Dino Risi, um dos grandes nomes do cinema italiano, que deu a conhecer a “comédia à italiana” ao mundo inteiro. Será possível rever clássicos intemporais como “Il Sorpasso” (“A Ultrapassagem”), “I Mostri” (“Os Monstros”) ou “Profumo di donna” (“Perfume de Mulher”).
Haverá também um espaço especial dedicado à música com o concerto dos Spaghetti Fusion, um coletivo internacional de músicos, colaboradores de importantes orquestras que adaptaram alguns dos temas musicais mais famosos do cinema italiano. Neste concerto, será́ possível ouvir ao vivo as composições de grandes autores como Ennio Morricone, Nino Rota, Riz Ortolani, Armando Trovajoli e muitos outros, acompanhadas das sequências projetadas no grande ecrã.
A sessão de encerramento acontece a 13 de abril, com a exibição de “In guerra per amore” de Pierfrancesco Diliberto, com a presença do realizador. O júri da secção competitiva é composto por Rita Blanco, João Braz e Cláudia Varejão."
Secção Panorama
Sonhos Cor-de-Rosa, de Marco Bellocchio (filme de Abertura)
In guerra per amore, de Pierfrancesco Diliberto (filme de encerramento)
Políticos não se confessam, de Roberto Andò
Amigos, Amigos, telemóveis á Parte, de Paolo Genovese
Se Deus Quiser, de Edoardo Falcone
The Stuff of Dreams, de Gianfranco Cabiddu
I can quit whenever i want – masterclass, de Sydney Sibilia
Italian Race, de Matteo Rovere
Tommaso, de Kim Rossi Stuart
Let Yourself Go!, de Francesco Amato
Something New, de Cristina Comencini
Indivisible, de Edoardo de Angelis
What’s the Big Deal, de Edoardo Leo
7 Minutes, de Michele Placido
Secção Competitiva
The Bear Skin, de Marco Segato
Ears, de Alessandro Aronadio
Feather, de Roan Johnson
Um Beijo, de Ivan Cotroneo
Fiore, de Claudio Giovannesi
Worldly Girl, de Marco Danieli

Memórias de Raul Brandão
Código: 00661
Última edição: março de 2017
N.º de páginas: 624
Editor: Quetzal Editores
ISBN: 9789897223365
Sinopse
"Três volumes reunidos num só volume de Memórias para a comemoração do 150.º aniversário de Raul Brandão. Publicadas originalmente em três volumes, as Memórias de Raul Brandão constituem um dos exemplos maiores do género na nossa literatura. Memórias pessoais, memórias do seu tempo político e cultural, memórias das pessoas com quem o autor privou ao longo de uma vida consagrada à literatura e ao conhecimento dos outros - as recordações de Raul Brandão transportam-nos para um tempo, para uma sensibilidade e para um modo de escrita irrepetíveis: condensam um talento e um génio literário único; retratam alguns momentos de grande agitação política (as duas primeiras décadas do século xx); constituem um testemunho indispensável para se compreender não apenas a sua obra mas também o país a que ela se refere como uma obsessão."
A Sétima Função da Linguagem de Laurent Binet
Quem matou Roland Barthes?
Código: 00660
Última edição: março de 2017
N.º de páginas: 472
Editor: Quetzal Editores
ISBN: 9789897223198
Sinopse
"O ponto de partida deste romance é a morte de Roland Barthes, atropelado pela carrinha de uma lavandaria no dia 25 de fevereiro de 1980. E a hipótese levantada é a de que se tratou de um assassínio. Nos meios intelectuais e políticos da época, todos são suspeitos. Quem atropelou o aclamado semiótico andava atrás de um misterioso documento que continha a sétima função da linguagem - a qual permitiria convencer quem quer que fosse a fazer o que quer que fosse, onde quer que fosse. E os políticos estrangeiros, não estariam eles também dispostos a tudo para se apoderarem de uma extraordinária ferramenta de poder como esta?" 
“Diário de Viagens Fora da Minha Terra”
Autor: Eugénio Lisboa
Editora : Opera Omnia
Publicação: Fevereiro de 2017
Sobre o livro:
Todo este livro é um guia de inexcedível riqueza. As anotações  surgem  ora em perscrutador olhar sobre a realidade que se lhe apresenta, ora em  rica observação, enformada por um conhecimento profundo dos referentes culturais do país. Todas se somam  e se  agregam num singular  e precioso contributo  para  um diferente e   mais completo entendimento de um país a visitar. Eugénio Lisboa desperta-nos o desejo adormecido que há séculos viaja no coração do homem: a descoberta do mundo.
Um desassombrado livro de viagens a ler, um magnifico diário a descobrir, uma obra de  extraordinária relevância para todos aqueles que gostam de saber como se construíram os dias de um culto e arguto viajante, em  diferentes viagens pelo mundo.
Título: Traços Fundamentais da Cultura Portuguesa
Autor: Miguel Real
N.º de Páginas: 248
PVP: 17,76€
Nas livrarias a partir de 5 de Abril
«A presente obra que Miguel Real oferece ao grande público sobre alguns dos mais relevantes traços da nossa cultura, acaba por atalhar de forma analítica, fazendo um ponto da situação, aqueles que constituem os nós górdios e aos mesmo tempo os principais «complexos» da história da cultura portuguesa.
Prof. José Eduardo Franco, do Prefácio.
Miguel Real  nesta obra, afirma que  «constituem a representação mental geral dos portugueses que historicamente o têm definido como povo: o complexo viriatino (de Viriato; povo humilde mas ousado), o complexo vieirino (de padre António Vieira; povo que supera as próprias forças e dimensão territorial atingindo níveis históricos grandiloquentes), o complexo pombalino (de Marquês de Pombal, povo que imita acriticamente tudo o que no estrangeiro é nomeado com sucesso, considerando o que provém do exterior superior ao que é nacional) e o complexo canibalista (um povo embrutecido e fanatizado, mesquinho, invejoso e bárbaro que, desde a segunda metade do século XVI, com alguns intervalos de liberdade, vive na ânsia de agradar a chefes e instituições numa ortodoxia capaz da denúncia, da prisão, da tortura e da morte do adversário).»
«Hoje, apenas os portugueses com menos de 30 anos conhecem […] uma existência sem repressão política e sem guerra, não sendo assim motivo de espanto que esta nova geração, já plenamente europeia nos costumes, tanto positivos quanto negativos, assuma em consciência a face de um novo Portugal urbano e cosmopolita, eticamente relativista, em total ruptura com o antigo Portugal rural e religioso, eticamente absolutista. […]Com esta nova geração urbana e europeia, em tudo similar às gerações dos países da Europa Central, prepara-se Portugal para enfrentar o século XXI, libertando-se definitivamente de um passado económico, político e cultural que há meio milénio, com breves excepções, a mais forte das quais entre 1415 e 1539, sempre lhe atrofiou as virtualidades.» 

terça-feira, 4 de abril de 2017

Celebrar a Paz em Angola

Há quinze anos, a 4 de Abril de 2002, os angolanos viram nascer uma nova época. Acabava definitivamente uma guerra fratricida que  deixava marcas profundas . A paz chegava e aspirava-se  a uma viragem no rumo do país. Um acordo assinado pelas partes em contenda, UNITA e MPLA , registava esse compromisso. 
O país cresceu, a livre circulação foi sendo instituída através de uma desminagem constante e da construção  de novas rodovias.
O dia da Paz passou a ser uma celebração real. 

Hoje, os dias vivem-se sem qualquer ameaça de guerra. Angola revestiu-se de uma paz efectiva, embora os dias não estejam fartos porque a crise assim os condiciona. No entanto,  sem medo e resilientes, os angolanos partem à busca do pão de cada dia. Pela manhã, ainda os raios purpúreos africanos não pincelam o horizonte, já  as  ruas acordam e começam a encher- se  de cor e de sons. Os panos, as roupas coloridas em linha com os  pregões das quitandeiras e dos vendedores, que tudo vendem, são a expressão de uma Angola que não esmorece. As filas de trabalhadores que acorrem aos machimbombos  ou aos transportes paralelos, os candongueiros,  dão força à vontade de vencer. 
Angola um país que tem tudo , basta, apenas, estar  na mão de cada e de todos angolanos para que a Paz seja plena.

segunda-feira, 3 de abril de 2017

Jack London

Jack London
Jack London, o mito permanente
Por Irapuan Costa Júnior
“Um dos mais vigorosos autores norte-americanos, Jack London, não teve até agora uma biografia à altura de sua vida, movimentada o bastante para preencher um livro onde se mesclariam aventura, drama, política, romance e tragédia. Fora alguns fracos relatos biográficos aqui e ali (incluindo um , escrito pela filha de Jack, Joan London, em 1938), dois autores intentaram descrever a sua vida: Irving Stone, em 1938, e mais recentemente, Alex Kershaw, em 2000. O livro de Stone foi traduzido e lançado, há anos, no Brasil, com o título: “A Vida Errante de Jack London”. Deixa muito a desejar, levando em conta que o autor fez trabalhos melhores, incluindo uma biografia de Van Gogh, e uma de Michelangelo, levada ao cinema no filme “Agonia e Êxtase”, com Charlton Heston.
Talvez os métodos de pesquisa, relativamente pobres na década de 1930, tenham limitado o trabalho de Stone. Kershaw teve mais sucesso, embora não se possa dizer que seja uma biografia definitiva. Com mais fontes ao seu alcance, encontrando dados organizados em bibliotecas, universidades e fundações mais recentes, ele conseguiu construir um livro mais profundo, aprimorado e ilustrado. Pena que ainda não haja tradução em português. Mas quem quiser conhecê-lo, pode conseguir a versão espanhola, “Jack London — Un Soñador Americano”, da Editora La Liebre de Marzo, de Barcelona. A internet põe qualquer livraria do mundo ali na esquina.
London escreveu o que viveu, e seus livros têm três cenários distintos: o mais apreciado é, sem dúvida, o da corrida do ouro no Alaska, vindo depois o das ilhas até hoje deslumbrantes do Pacífico Sul e finalmente o espaço político socialista (e comunista) norte-americano do fim do século XIX e início do século XX. Nesses três cenários, Jack London gastou intensamente a sua breve existência, viveu as emoções mais profundas, correu os riscos mais mortais, travou as mais duras batalhas. De facto, tinha o que relatar. Cumpriu o que prometia: “Mais vale uma existência curta, mas brilhante. Não passarei meus dias tentando prolongá-los; prefiro ser cinzas a ser pó”. Morreu aos 40 anos. Uma emenda: além dos relatos nesses três espaços que mencionei, Jack London também deixou uma produção curta, mas de qualidade, no que poderíamos classificar como ficção científica. E uma novela autobiográfica, “John Barleycorn, ou Memórias Alcoólicas”, na qual narra a luta com o alcoolismo.
Não podia, como todo homem inteligente, deixar de se perguntar: de onde viemos, para onde vamos? London buscou respostas em algumas fontes conhecidas: Spencer, Darwin, Marx e Nietzsche. Teve como livro de cabeceira, durante anos, “Os Primeiros Princípios”, de Herbert Spencer. Encantou-se com Charles Darwin depois das aventuras no vale gelado do Yukon, onde a sobrevivência era privilégio dos mais fortes. Achou que Karl Marx tinha as respostas quando a sensibilidade que ele escondia atrás de sua fortaleza indagava sobre as injustiças sociais. Foi um militante comunista. Mas en­­­cantava-se com a ideia de que havia seres superiores, mais fortes e mais aptos — condutores — destinados a apontar caminhos para as massas, como interpretava nas leituras de Friedrich Nietzsche (1844 — 1900), justamente o filósofo que inspiraria Hitler, meio século depois, a tentar esmagar o comunismo. No último ano de vida, ainda buscou respostas noutro psicólogo e psiquiatra: Carl Jung.
Jack London teve uma infância pobre e difícil, na companhia da mãe, Flora Wellman Griffith, abandonada pelo primeiro marido, e pai de Jack, que nunca o reconheceu, William Chaney, quando o garoto tinha apenas alguns meses. Aos quatorze anos, logrou terminar a escola secundária, mas a penúria não só o fez interromper os estudos, como o obrigou a um trabalho duro, de 12 horas diárias ininterruptas e miseravelmente pagas, numa fábrica de São Francisco, onde havia nascido. Vivia então em Oakland, do outro lado da baía de São Francisco. Autodidacta desde essa idade, nas horas vagas frequentava a biblioteca de Oakland. E foi então que, para fugir às agruras da vida, começou com a bebida, vício que não deixaria — embora o negasse — até a morte prematura. Outra consequência desses tempos duros foi fazê-lo abraçar, mais tarde, o comunismo, que nada mais era, à época, do que uma teoria promissora de igualdade e abastança, e só mais tarde viria, na prática, a mostrar a sua crua face de utopia esmagadora. London, em busca de  uma independência — já falava em ser escritor — passou por uma fase em que pilhava ostras nos viveiros da baía de São Francisco, em camaradagem com outros jovens piratas. Depois mudou de lado, e empregou-se na guarda costeira, que perseguia os piratas.
Aos 17 anos,trabalhou  num navio que se dirigia, na caça às focas, ao gelado Mar de Bering. Quase um ano no mar e ele desembarcou de novo ,na baía de São Francisco com algum dinheiro — pouco — no bolso, mas muitos livros lidos a bordo, muitas aventuras vividas e muitas ideias na cabeça para novelas e contos futuros. Foi dessa experiência que tirou mais tarde um dos livros de maior sucesso de sua carreira (e da literatura americana): “O Lobo do Mar”. O pontapé inicial de sua vida de escritor foi dado nessa volta: London ganhou um concurso para autores jovens que um jornal de São Francisco havia aberto, com o conto “Tufão nas Costas do Japão”. Não havia feito nada mais que contar, com seu talento nascente, uma experiência que o havia marcado para sempre, e que não se cansaria de mencionar em suas conversas: o quase naufrágio do navio caça-focas em que estava, quando enfrentou um furacão na costa japonesa. Passou dois anos acompanhando pelos EUA desempregados pela depressão de 1890 e frequentando reuniões promovidas pelo Partido Comunista Americano, uma criação de imigrantes alemães da década de 1840, a que Jack aderiu com entusiasmo juvenil, mesmo porque já era leitor de Marx.
Foi aos vinte anos, em 1896, que fez a última tentativa de concluir um ensino formal. Estudando só, e com muito esforço, desempregado, conseguiu ser aprovado na admissão ao curso de letras da Universidade de Berkeley. Não ficou um ano. Tinha que trabalhar, cuidar da mãe. E era muito inquieto para o formalismo dos bancos de escola. Convencido de que havia de ser escritor, começou a enviar trabalhos para revistas americanas, sem sucesso. Foi obrigado a aceitar alguns empregos menores para sobreviver, até que ouviu falar de Klondike, no noroeste do Canadá, onde o ouro era abundante e a fortuna era fácil. Conseguiu um empréstimo com a irmã de criação (Flora, a mãe, havia se casado pela segunda vez, com um viúvo, John London, que tinha um casal de filhos, e de quem Jack adoptaria o sobrenome) e, junto com o marido dela, partiu para o Alaska. Jack tinha 21 anos. Viajaram num navio onde se empilhavam centenas de aventureiros ansiosos pela colheita de ouro. Pouquíssimos conseguiriam algum sucesso, e muitos encontrariam a morte pela cansaço, pelo congelamento, pela fome, pelas disputas entre eles mesmos ou com os nativos ferozes. Depois de um ano e muitas dificuldades, incluindo um grave ataque de escorbuto, Jack estava de volta a São Francisco. Sem um grama de ouro sequer, mas com uma fortuna intangível na memória: lembranças para mais contos e novelas  a que ele chamou de o silêncio branco dos homens e animais que o desafiaram. Jack agora só queria escrever.
Leitor de Herman Melville, Robert Louis Stevenson, Zola, Flaubert e Turgueniev, sonhava com o sucesso deles. Acima de tudo, invejava Rudyard Kipling, então o escritor mais famoso do mundo. Chegou a copiar, à mão, as obras de Kipling, pensando assim absorver seu estilo. Logo London, dizendo-se comunista e admirando o mais colonialista dos autores. Durante quase um ano, a máquina de escrever de Jack trabalhou muito, mas os resultados não vinham. Jornais e revistas publicaram alguma coisa, sem grande repercussão. Por sobrevivência, London chegou a ocupar um posto inexpressivo nos correios, até, que em 1899, a maior revista da costa oeste americana, “Overland Monthly”, publicou o seu conto — que até hoje faz parte das grandes antologias do conto mundial — “O Silêncio Branco”. O sucesso foi imediato, e lhe abriu as portas de outras publicações, inclusive da então maior revista americana, a “Atlantic Monthly”, que fechou com ele um contrato para mais algumas estórias. Com a fama crescente vieram os contratos com as editoras, revistas e jornais, mas nunca a fortuna. London gastava sempre mais do  que ganhava e vivia atolado em dívidas. Alguns anos depois, num artigo na revista “The Editor”, daria conselhos aos pretensos escritores, e usaria uma frase que seria repetida e tornada famosa por Churchill décadas depois, no começo da Segunda Guerra: “Não deixe seu trabalho para escrever, a não ser que ninguém dependa de você. De todas as classes de obras, a ficção paga melhor e quando tem qualidade, se vende mais fácil. Uma boa piada vende melhor que um bom poema e, visto que você verteu sangue, suor e lágrimas, estará mais bem remunerado…”.
Entre 1902 e 1915 foram publicados os seus livros de maior sucesso, alguns ainda sobre o Yukon: “A Filha das Neves”, “O Chamado Selvagem” e “Caninos Brancos”, outros sobre a vida no mar: “O Lobo do Mar” e “O Motim do Elsinore”, os politicamente engajados: “O Tacão de Ferro” e “Martin Eden”, e os science-fiction: “Antes de Adão”, “A Praga Escarlate” e “O Vagabundo das Estrelas”. O livro “A Estrada”, de Cormac McCarthy, tem muito de “A Praga Escarlate”. Houvesse o que houvesse, Jack escrevia mil palavras por dia. Só assim pôde produzir tanto em poucos anos de trabalho (e de existência). Mas uma vida de bebedeiras, drogas (sim, já existiam) e péssima alimentação cobrou a conta. Ele não estava disposto a pagar. Sua saúde deteriorava-se rapidamente. O antigo boxeur tornara-se frágil. Matou-se, ingerindo morfina, em 1916, aos 40 anos. Alex Kershaw, inexplicavelmente, esconde ou lança dúvidas sobre esse acto. Inútil. É sabido que London até calculou a dose fatal antes de tomá-la.
Bonito, atlético, bem falante, e, no final, famoso, foi homem de muitas mulheres. Nunca amou, na verdade, a primeira mulher, Elizabeth (Bess) Madern, que lhe deu duas filhas, e que guardou ressentimentos até a morte por ter sido abandonada e trocada pela melhor amiga, Charmian Kittredge, ela, sim, o grande e permanente amor, correspondido, de Jack London, que teve ainda, ao lado de muitas aventuras ocasionais, um amor platónico: a bela judia Anna Strunsky, que acabou se casando com outro, para grande desgosto de Jack, mas que manteve correspondência com ele, por quem tinha grande admiração e amizade, até sua morte.
London é muito lido, até hoje, e não só nos países de língua inglesa. E já lá vai um século desde que morreu. Por que é tão lido? Jack London, como todo grande escritor, consegue agitar a  nossa alma. Aprofunda algumas de nossas perguntas mais renitentes e até consegue responder a outras. O faz, às vezes, num simples conto. London foi, como Tchekhov, acima de tudo um grande contista. Sugiro ao leitor dois contos,  reveladores da sabedoria da vida: “O Combate” e “As Tartarugas do Tasman”.
Os romances políticos, ainda que de um vigor incomum, não são o melhor de sua produção. Não foi Marx o seu maior inspirador. O que conta mesmo, em sua obra, e é conhecido por isso, é a descrição do que se convencionava chamar “struggle for life”. A luta que todos enfrentamos, em alguma ocasião, por nossa existência. O instante fatal, a que poucos conseguem emprestar o valor e o brilho — mencionado por Kipling admirado por London. E, embora com o coração tocado pela solidariedade, pela fraternidade e pela brandura, Jack London relatou o que viveu, e viveu a dura disputa pela sobrevivência, o homem contra outros homens, contra animais e contra a natureza, ora perdendo, ora vencendo.
Lutador pela igualdade entre os homens, sempre exaltou os mais fortes, e nunca deixou de enunciar a lei da natureza que contempla os mais aptos. Acreditou mesmo nessa igualdade inexistente? Defensor do internacionalismo, viu no Britânico qualidades superiores, de desbravador e civilizador, a ponto de sempre falar no “fardo do homem branco”, do poema de Kipling, cujos primeiros versos são mais que sugestivos: “Toma o fardo do homem branco/ Desterra o melhor de tua prole/ Obriga teus filhos ao exílio/ A servir as necessidades dos conquistados/ A esperar com pesadas cadeias/ Sobre um povo abatido e selvagem/ As recém aprisionadas desconsoladas pessoas/ Meio demónios e meio crianças”. O facto é que a lei da vida está presente em seus escritos mais atraentes, mais vigorosos e até mais verazes. Foi ela, com sua dureza, e não outra lei qualquer, por mais ideal e encantadora que fosse, que ele encontrou pela existência afora, como não poderia deixar de ser. Uma lição de sua obra é a de que podemos sonhar com outros mundos, mas a natureza inexorável nos traz de volta a este onde vivemos, tão logo abramos os olhos. Onde a brandura é mais rara que o ouro. A natureza não derrama lagrimas.” Irapuan Costa Júnior, em Ensaios, Revista Bula, Brasil

domingo, 2 de abril de 2017

Ao Domingo Há Música

"Agostinho dizia « Bem – tu escutas esta palavra e respiras fundo, tu a ouves e suspiras». E ele afirma que o homem não pode exprimir em palavras o sentido mais profundo, a riqueza que se esconde na noção de ‘bem’, assim como a sua completa realização: "Dizer, não se pode; calar, também não... Mas o que fazer, se não é possível falar e não dá para calar? Exultai! Jubilate! Levantai a voz sem palavras da vossa profunda felicidade!". 
Esta "voz sem palavras" (ou uma de suas formas) é: a música! Contudo, ela não é só a voz da felicidade, mas também a voz sem palavras da infelicidade, da carência pela ausência, da frustração, da tristeza, do desespero (a meta não é alcançável sem mais, pois pode ser íngreme e também pode ser dada por perdida!)". No desenrolar mais profundo da realização do ser, mesmo onde a linguagem não se expressa, encontra-se esse impulso natural (também do espírito!). "Daí se segue", diz Kierkergaard "que a música se acha relacionada à fala, tanto precedendo, como sucedendo, manifestando-se como primeiro e como último". A música produz um âmbito de silêncio; nela, a alma entra ‘nua’, por assim dizer, sem a "veste" da oralidade "que se enrasca em todos os espinhos". Paul Claudel

Vestir a alma de Música é o convite para este  Domingo de Abril. Quem o lança é a violinista  Akiko Suwanai , numa  soberba interpretação de Bruch's Violin Concerto No.1  , acompanhada pela Sapporo Symphony Orchestra, sob a direcção do Maestro Tadaaki Otaka.

sábado, 1 de abril de 2017

Que blasfémia!

"Mas a verdade é para ser dita, meu amigo, e a verdade é esta: os cães são capazes de ler. Se assim não fosse, por que motivo é que eles haviam de pôr aqueles letreiros nas portas das estações dos correios? PROIBIDA A ENTRADA A CÃES, EXCEPTO CÃES-GUIAS. Estás a ver aonde é que eu quero chegar? O homem que vai com o cão não vê; se ele não vê, como é que vai ler o letreiro? E se ele não lê o letreiro, quem é que o vai ler por ele? É disto que fazem aquelas escolas que eles têm para cães-guias. Só que não dizem nada cá para fora. Têm mantido segredo absoluto acerca disso, neste momento é um dos três ou quatro segredos mais secretos de toda a América. Se a coisa começasse a espalhar-se, imagina só a revolução que não iria ser. Os cães tão inteligentes como os homens? Que blasfémia!"
Paul Auster, in Timbuktu, Edições Asa