sábado, 14 de janeiro de 2017

Existimos a sós

"Vivemos, agimos e reagimos uns com os outros; mas sempre, e sob quaisquer circunstâncias, existimos a sós. Os mártires penetram na arena de mãos dadas; mas são crucificados sozinhos. Abraçados , os amantes buscam desesperadamente fundir seus êxtases isolados  numa única autotranscendência; debalde. Por sua própria natureza, cada espírito, em sua prisão corpórea, está condenado a sofrer e gozar em solidão. Sensações, sentimentos, concepções, fantasias--tudo isso são coisas privadas e , a não ser por meio de símbolos, e indirectamente, não podem ser transmitidas. Podemos acumular informações sobre experiências, mas nunca as próprias experiências. Da família à nação, cada grupo humano é uma sociedade de universos insulares.
[...] Contemplarmo-nos do mesmo modo pelo qual os outros nos vêem é uma dádiva das mais confortadoras. E não menos importante é o dom de vermos os outros tal como eles mesmos se encaram. Mas e se esses outros pertencerem a uma espécie diferente e habitarem um universo inteiramente estranho? Assim, como poderá o indivíduo, mentalmente são, sentir o que realmente sente o insano? Ou, na iminência de ser reencarnado na pessoa de um sonhador, um médium ou um génio musical, como poderíamos algum dia visitar os mundos que para Blake, Swedenborg ou Johann Sebastian Bach eram seus lares?"
 Aldous Huxley, in As portas da percepção, Ed. Antígona

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