terça-feira, 19 de julho de 2016

Sobre o tempo que passa

A morte de cada homem diminui-me, porque eu faço parte da humanidade;
eis porque nunca pergunto por quem dobram os sinos: é por mim
.

                                 John Donne


Se há tempo marcado pela tragédia, este é o tempo. Não da forma calamitosa que muitas intempéries naturais atingem o homem e o seu habitat, embora as imagens de uma aldeia chinesa esteja presente no nosso olhar. Foi quase agora. Era a fúria das águas congregada na destruição de qualquer casa que se lhe apresentasse, derrubando-a como de papel se tratasse.  Num ápice, uma aldeia passou a ser  uma pequena mancha na avalanche aquosa e barrenta de uma remota e montanhosa região da China.
Não. Não é  essa trágica acção da natureza que marca este tempo. O homem ultrapassou qualquer devastação provocada pelas  forças que regem o mundo. É a crueldade do novo homem , de um homem que não sabíamos.
Não há dia que não nos sobressalte. Os actos são de tamanha maldade que a agonia nos toma também.
Foi a 14 de Julho, em Nice. Era dia de celebração e surgido do nada , um só homem mata, dizima quem regressa da festa da Liberdade. Era talvez um homem acossado pela liberdade de acção num país que soube resgatá-la . Friamente, mata indiscriminadamente porque é a hora da sua insana chacina.
Explorar  este tipo de mente humana não é fácil , nem o sei fazer. Apenas o horror de tal mortandade me persegue numa dilaceração profunda. A frieza, a bárbara condução deste tipo de  homem que desconhecíamos e que vive em qualquer rua de uma cidade pacata ou de uma grande metrópole é a maior tragédia deste tempo.
Na Alemanha, um outro novo homem agride com um machado quem viajava num comboio. Nos USA, um ataque mortífero. A vingança assassina mata em nome de uma sangrenta e  falsa justiça.
Este novo homem anda entre nós. Aparece por aí, sem anúncio , na familiar agitação   do dia ou  no aparente sossego da noite.
Surge inopinadamente: ataca , mata, fere, mutila quem  nada temia e se pensava em segurança.  
Viver entre os homens já não é o antídoto contra o perigo do isolamento. 
Viver entre os homens é o sufoco que nos abafa nestes dias de terror, mas também a  sã temeridade  de enfrentar um novo dia  sem flectir. 
Viver  entre os homens é querer acreditar que só pela solidariedade e união  se poderá  combater a crueldade daqueles que se afastam.
Viver entre os homens é saber que sempre que um homem morre, morre também uma parte de nós.

1 comentário:


  1. É precisamente como descreveu, nada voltará a ser como era, o terror e a maldade sem sentido, podem acontecer em qualquer parte do mundo, seja na vida quotidiana ou no lazer, provocado por seres sem conteúdo, máquinas assassinas..
    ...

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