terça-feira, 17 de abril de 2012

Simplesmente Amo-te

Soneto – X L I V
Saberás que não te amo e que te amo
posto que de dois modos é a vida,
a palavra é uma asa do silêncio,
o fogo tem uma metade de frio.

Eu te amo para começar a amar-te,
para recomeçar o infinito
e para não deixar de amar-te nunca:
por isso não te amo todavia.

Te amo e não te amo como se tivesse
em minhas mãos as chaves da fortuna
e um incerto destino desditoso.

Meu amor tem duas vidas para amar-te.
Por isso te amo quando não te amo
e por isso te amo quando te amo.
Pablo Neruda, in “Cem Sonetos de Amor” Ed. Campo das Letras

Eu Simplesmente Amo-te
Eu amo-te sem saber como, ou quando, ou a partir de onde. Eu simplesmente amo-te, sem problemas ou orgulho: eu amo-te desta maneira porque não conheço qualquer outra forma de amar sem ser esta, onde não existe eu ou tu, tão intimamente que a tua mão sobre o meu peito é a minha mão, tão intimamente que quando adormeço os teus olhos fecham-se.
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor" , Editora Campo das Letras

Não te quero senão porque te quero

Não te quero senão porque te quero
E de querer-te a não querer-te chego
E de esperar-te quando não te espero
Passa meu coração do frio ao fogo.

Te quero só porque a ti te quero,
Te odeio sem fim, e odiando-te rogo,
E a medida de meu amor viageiro
É não ver-te e amar-te como um cego.

Talvez consumirá a luz de janeiro
Seu raio cruel, meu coração inteiro,
Roubando-me a chave do sossego.

Nesta história só eu morro
E morrerei de amor porque te quero,
Porque te quero, amor a sangue e fogo. 
Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor" , Editora Campo das Letras

3 comentários:

  1. Amor "vai formoso e não seguro", desta vez pela pena de Pablo Neruda... Para além de poeta, diplomata, viajante incansável, exilado político, Pablo, como bom amante dedicou ao Amor e à Mulher muitas das suas poesias, dos seus sonetos, e igualmente muitos kms de prosa, daquela prosa límpida, serena, perfumada de "dama da noite", com sorrisos de flores, olhares, alegrias, sempre com um optimismo endógeno. Percorreu mundos e mundos, peregrino do conhecer, paladino do convívio com outros povos, num processo de aculturação notável, capacidade de aculturação essa, a maior parte das vezes esquecida pelos seus biógrafos. Sempre longe do seu amado Chile, e nem sempre num encantado deslumbramento... É verdade. Então, percorrendo os caminhos da solidão, a dor da lonjura, e uma certa errância, fizeram-lhe chorar algumas lágrimas pesadas. Politicamente colocou-se sempre ao lado dos mais desfavorecidos, dos campesinos que esmagados pelo capital se dobravam de sol a sol, e dos que trabalhavam "enterrados" nas minas, de todos os que lutavam pela sua própria liberdade, pela independência. Deixou a vida, suavemente, a vida que lhe coube, e que não tinha preço! Tal como a liberdade pela qual toda a sua vida pugnou corajosamente.

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  2. Interessante como o autor evidencia esse "amor" que aceita e recusa quase que condicionalmente para perpetuar sua existência. Expressa o dilema interior envolvendo conflitos que destacam-se em momentos de desejar e não querer, talvez, quem sabe... Revelando um posicionamento consciente, porém, oscilante diante do potencial explosivo das emoções que lutam dentro do coração tão incontroláveis que não pode determinar limites em si.

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    1. Muito bem observado Dalva Eline!... Querer e não querer, poder e não poder, surgir como realizado sem jamais se realizar.

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