segunda-feira, 23 de abril de 2012

No dia Mundial do Livro

O homem que lê

"Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde... em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.

E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa. "

Rainer Maria Rilke, in ” O Livro das Imagens”, Relógio D'Água

1 comentário:

  1. Pessoalmente, para nós todos os dias são de leitura. Quem é que disse que após a conclusão de uma licenciatura, ou mesmo de um mestrado iríamos parar de estudar?!... Quem?!... Pura utopia!... A cada dia, mais se estuda, mais necessidade temos de saber. Nunca se estuda tanto como quando se aproxima a recta final! Dia do livro, sim. Porém o livro em si, como objecto de mercadoria, está caro, dispendioso para a maioria dos portugueses. E quando toca a edições brasileiras chegadas a Portugal, aí então, ainda ficam mais caros!... Nestas matérias de câmbio livreiro, com tantos acordos bilaterais, em todas as épocas em que se celebraram entre os dois países irmãos, séculos XX e XXI, parece nada terem adiantado. O livro português no Brasil está "pelos olhos da cara", e em Portugal, quanto ao livro editado no Brasil, outro tanto! Lamentamos!... Todavia, celebremos o livro neste dia do livro, e mais que o livro, celebremos a sua leitura. Se não houver leitura, mais leitura, os livros serão apenas objectos decorativos..., alinhados nas estantes.

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