quinta-feira, 12 de abril de 2012

Angola, terra de fogo

"Para que percorres inutilmente o céu inteiro à procura da tua estrela? Põe-na lá."
                                                                       Vergílio Ferreira, in “ Escrever”
Sempre que se chega a África, regressa-se a um mundo que nunca se esquece . Quando as portas do avião se abrem é um imenso e familiar fogo que se espalha por todo o corpo e o cheiro da terra recaptura-nos com tal intensidade que nos sentimos envergonhados pela  traição da ausência. E  a memória de tudo quanto ficou em nós reacende-se. Basta chegar. África envolve-nos e estamos de novo num mundo que não tem termo de comparação com outro continente. A Europa fica  distante , acabrunhada numa assertividade  disciplinada  e caduca que nada tem a ver com o fulgor  que se solta num continente em construção , espalhado por uma vasta área diversa, desigual.
Chegar a Angola é tudo isso e muito mais. Nada está na mesma. Tudo se alterou embora tenha passado apenas uma década de ausência. É a década da PAZ, ou talvez a década da mudança.
 Os sons de uma natureza pródiga e inarrável permanecem inalterados , os tons do céu tropical, como sempre, raiam-se vermelhos num festim de fim de tarde, mas a marca urbana quer a nível habitacional, quer a nível rodovíário, quer a nível social  alterou-se profundamente. Rasgaram-se campos com diferentes vias rodoviárias, construiram-se novos aglomerados habitacionais e projectaram-se muitas infra-estruturas. Luanda, o centro gravitacional do país, está diferente. Cresceu e está em permanente refazer da sua configuração. 
Sair ou entrar na cidade pode ser feito através de vias rápidas, contudo circular no meio urbano é um autêntico desafio. Filas imperdíveis de veículos, de autocarros públicos e paralelos (candongueiros) , num labiríntico e curto circuito  pode durar horas em desespero de quem tem horários a cumprir.
Quem conheceu Luanda  já não descortina as ruas que compõem a cidade e arredores. A grande  massa humana que, nos mercados ao ar livre, apresenta uma  diversidade de produtos para venda , produtos cuja variedade  empresta cor a  muitas das ruas, das estradas  ,dos becos, dos caminhos, habita maioritariamente  musseques  construidos dentro e em redor da cidade. A arquitectura urbana adquiriu, desse modo, uma nova forma e uma forte densidade  que ronda quase a metade da população nacional.
Luanda e os seus arredores transformaram-se num imenso centro populacional composto por diferentes classes sociais que labuta pelo mesmo objectivo: (sobre)viver melhor em cada dia.
Entretanto, o país também se alterou. Não foi apenas a capital. A desminagem foi e continua a ser uma grande aposta , pelo que viajar é já uma realidade segura.
Angola deslumbra-nos nos seus contrastes paisagísticos. A folia das cores anda à solta neste país. São os verdes profundos e matizados de uma vegetação que chega a explodir nas águas dos rios.  Os campos pintam-se, por vezes, de carmesim com as  terras encarnadas numa alegria soberba  que se expande para lá do horizonte. As savanas surgem majestosas e rasteiras   habitadas por uma  fauna profusamente variada e de singular diversidade cromática.Mas o  deslumbramento emerge avassalador perante esses infindáveis areais que beijam um   mar que se solta leve, quebrado, movediço, sempre  pintado por múltiplas paletas, partindo-se em finas nuvens de espuma apenas para nos afagar.
Angola está aí. Um país em crescimento onde todos os angolanos querem ser felizes. Há lugar para todos acederem à felicidade desde que todos se revejam como irmãos e se permitam repartir um país rico e imenso.
Angola faz-se quando todos quiserem.
                                                                 

10 comentários:

  1. Obrigada pela poesia que nos deixa sobre Angola...
    Continuação de boa estada!
    Fátima Dias

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  2. Que bela descrição sobre Luanda!... Em especial pelo estilo deslizante, recortado, cheio de júbilo, por essa escrita tão sincera, quente, nostálgica e expontânea. Sem favor, um verdadeiro texto de Selecta, aberto à leitura de todos. O cuidado com a sintaxe igualmente encontra-se presente. E o realismo do descrito, da narrativa, faz sentir-nos na companhia da autora, aí em Luanda, tal a dinâmica e a adequação dos termos usados, das palavras que soube admiravelmente escolher para fotografar pormenores dessa pérola de África. Os nossos desejos que usufruam em Angola todo o tempo aí destinado. E boa viagem.

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  3. ola maria jose gostei da descriçao apesar de muito floriada mas esta bem- tenho uma prima da mena que esta em luanda mas vai brevemente para o norte --soio--que me da noticias frescas --espero que tenha umas boas ferias --joao branco

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  4. Como são doces e aquecidas as manhãs de Luanda!... Há vida, movimento, despertar. Há sinais de mundo em procura de mundos. Repare-se só no mercado em ebulição, naquele vozear frenético e contagiante, no rodopiar das gentes, mexendo-se ondulante e nervoso e coleante, no colorido do vestuário, onde as cores vivas trespassam a alma, vivido no calor envolvente dos corpos, no sonoro e mastigado regatear entre o que compra e o que vende!... Na juventude que circula...Que tem tudo isto a ver com a envelhecida e anquilosada Europa, lá longe, ode tudo se torna sério e há muito se perdeu a alegria do riso?!...

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  5. Muito além do requinte intelectual deste texto, preocupa-me saber o que de positivo e de inconfessável os chineses estão fazendo em Angola, diante de uma imigração impactante, sinistras denúncias e um novo colonialismo?

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    1. Possível tentativa de resposta a Manuel... Talvez, um novo colonialismo, talvez,... pois o evoluir da História é cíclico, embora mude ligeiramente o enquadramento, a coreografia, e ainda muito mais os próprios actores em cena... Talvez... Todavia, os povos têm de relacionar-se, de cooperar uns com os outros. São livres. A decisão e o ganho pertence sempre ao povo angolano, que é soberano.

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    2. Os actores mudam com os tempos conforme a história se escreve. A China chegou a Angola num tempo difícil e prestou-se ao que muitos se negaram.Decifrar o que não é público não é para qualquer um.Fica, porém, visível uma imensa população chinesa espalhada pelo país que se dedica a todo o tipo de negócio. Angola é talvez o país africano com maior implantação chinesa. A escolha foi feita e está em marcha. .
      Esperemos que sendo a China um estado emergente, não espalhe pelo mundo os tentáculos do poder económico cegando o real poder que deve liderar o mundo: a liberdade e o respeito pelos direitos do Homem.

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    3. Agradeço a Varela Pires e a editoria do site a atenção ao meu comentário, como pessoalmente agradeço a ambos pelo estimulante convívio nessa aldeia de encanto e de lirismo encrustada no espaço virtual do Algarve. Ao primeiro, pelas irretocáveis apreciações dos meus textos, e à segunda pelas portas que abriu para minha poesia em Portugal.
      Quanto a Angola, as informações que tenho me induzem a manter essas tristes convições.
      SOBERANIA de Angola: que desejável sonho depois de tantas lutas pela Independência e tão lamentáveis disputas pelo poder.
      DECIFRAR O QUE NÃO É PÚBLICO: quem sabe um gesto muito perigoso e revestido de indigestos pressentimentos.
      A ambos o meu abraço, fraterno e brasileiro..., Manoel de Andrade

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  6. EXCELENTE BLOG. Felicidades. Desde Tlaxcala Mexico America

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