sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Corpo de Esperança

 

Começam por ti todos os versos...

...e um dia as aves voarão o céu até aos teu olhos,
as crianças hão-de pisar teu corpo de alegria
com seus risos, seus tácitos encontros com o invisível
e seu secreto esquecimento.

Num chão de cousas desapercebidas
terão passado sobre ti os reinos, as filosofias e os namorados,

E tu repousas, nua, no coração do Silêncio,
como uma estrela dentro do céu

Neste curto espaço entre nós e a morte
tão mal gastamos nossa longa despedida!

Tu, amor de quem não sei o nome
de onde não sei a sorte,
vais passar além deste poema que era teu
e assim, de morte construída,
teus passos vão enchendo a minha vida.

Outro nome será flor sobre teus lábios,
e outros dedos tocarão a límpida frescura
dos teus ombros quase d’água
e saberão de cor o horizonte branco do teu corpo...

E assim iremos de olhos futuros,
tu, envelhecendo da minha ausência,
eu, a erguer-te na curva da esperança,
e outra mão vai desmanchar a tua trança
e hei-de beijar teu rosto onde não eras
e serás só o que há antes das horas mais tristes.

Neste curto espaço entre nós e a morte,
onde me vais perdendo,
onde te vou buscando,
nosso amor se vai embora alimentando
a despedida;

não porque morra o tempo em teus braços,
mas a vida.
Poesia de Vítor Matos e Sá, edição de Ana Paula C. Mendes, ed. Campo das Letras, 2000

2 comentários:

  1. Ninguém morre de amor - deixem-se disso!... - o amor é que fenece, é que falece em nós, breve, muito brevemente. E o que sobra? O que sobra, é a apenas a amizade e o hábito!... Pouco mais. Muito pouco mais. - V. P.

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