segunda-feira, 11 de julho de 2011

Origem

Venho do branco perímetro das areias
do sal e da espuma
das rochas povoadas de mariscos
venho das estrelas do mar
do som dos caramujos
e de milhares de conchas recolhidas.
Venho das grandes calmarias
de suaves brisas
e fortes ventanias.
Venho de úmidas ribeiras
de costões e ribanceiras
e das areias peneiradas pelo vento.
Venho de marés e lua cheia
de uma paisagem ensolarada
venho de aquarelas deslumbrantes
e das auroras e dos crepúsculos de verão.

Venho de um arquipélago de canoas
de velas infladas
de rudes pescadores
das grandes redes deitadas sobre o mar
dos colares de cortiça estendidos sobre as águas
das tarrafas se abrindo como flores.

Venho dos covos e das puçás com suas iscas
de siris e caranguejos
dos lances de tainhas contadas aos milhares
dos invernos com seus cardumes bem ovados
de sardinhas bem lanhadas
venho do bom caldo de peixe

do pampo, do sargo e da betara
da salsa, da alfavaca e do cominho.

Venho da saudade de uma praia
de uma infância azul e branca
de um batel e dos meus remos
de um suave rio desembocando
e daquela “Ilha Feia” colocada no meio do horizonte.

Venho de um cenário que o tempo sepultou
meus esconderijos, meus atalhos
minha pequenina lagoa... onde está ???
tudo é aço e concreto nesta orla vertical
nesta inevitável invasão
nesta passarela de aparências
neste progresso que aterrou meu manguezal.
Curitiba, Abril de 2004
Manoel de Andrade , in “ Cantares” Fev. de 2007, Editora Escrituras, São Paulo,Brasil

Sem comentários:

Enviar um comentário